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Mark Day : “cada filme tem cerca de 2 horas e 20 minutos.”

Mark Day, editor dos filmes da série Harry Potter, conversou recentemente com o pessoal do site TheWorstSeats sobre o seu trabalho na edição de longa metragens. Até aqui nada de mais, certo? Mas acontece que além de dar alguns detalhes sobre o seu trabalho, falar sobre suas preferências, ele acabou deixando “escapar” a duração aproximada das duas partes de Harry Potter e as Relíquias da Morte. Ao responder quanto ele descarta na edição dos filmes da franquia, ele disparou:

“Eu não posso te dizer a quantidade exata do total de cenas que eu descarto, mas quando você pensa que duas unidades estiveram filmando Harry Potter (os dois últimos filmes) quase que continuamente por um ano e cada filme tem cerca de 2 horas e 20 minutos em média, não precisa ser um gênio para fazer o cálculo de que a proporção é elevada.”

O que calculando direitinho nos leva a um total de, aproximadamente, 5 horas de duração para contar o capítulo final da saga do menino bruxo mais ilustre do mundo do cinema. Portanto, tempo não vai faltar.

Para os interessados no trabalho de edição dos filmes, ou curiosos em geral, a tradução completa da entrevista pode ser lida em ‘Continuar lendo’. O texto em inglês pode ser lido aqui.

Entrevista com Mark Day, editor de filmes

Tradução por Cecília Bonfim

O assassinato de um pesquisador membro do parlamento na série da BBC “State of Play” teve a audiência aumentada meteoricamente com as reviravoltas, seguindo um ritmo alucinado com visuais de tirar o fôlego revelando as ligações entre o governo e os grandes negócios.

Quatro anos depois eu vi o quinto filme de Harry Potter, “A Ordem da Fênix” feito por um novo diretor e noav equipe. Fiquei maravilhado com o impacto e a grande melhora na habilidade de atrair a imaginação do público; melhoras na direção, na atuação já que as crianças cresceram e especialmente na excitação introduzida pela edição.

Fiquei fascinado com a oportunidade de conversas com o encantador e renomado editor de filmes Mark Day, cuja criatividade me impressionou tanto em ambas as produções. Eu também estava ansioso para descobrir sobre o papel do editor que enquanto todos sabem que é indispensável, muitas vezes é subestimado e não tão reconhecido ou admirado quanto o do diretor, produtor ou ator.

Incrivelmente talentoso, Mark ganhou três BAFTAs e também prêmios da Sociedade Real de Televisão (RTS) por seu trabalho em “Sex Traffic”, “State of Play” e “Screen Two: The Insurance Man” e foi indicado para outros incontáveis prêmios incluindo um Emmy por “The Girl in the Café”.

Trabalhando atualmente nos últimos filmes de Harry Potter, “Relíquias da MOrte” (partes I e II), Mark concordou bem simpático em separar um tempo na sua agenda apertada para responder sobre algumas perguntas minhas sobre a edição de “The Worst Seats” e falar sobre seu papel nos novos filmes de Harry Potter, e também sobre como ele entrou nesse Mercado e o que ele vê no seu futuro.

TWS: Como você começou a editar?

Mark Day: Comecei na BBC no curso que treinava assistentes de edição (infelizmente eles não fornecem mais esses cursos). Era fascinante porque íamos para salas de edição de vários departamentos, por exemplo, drama, documentários, música e arte, atualidades e infantis e passávamos 6 semanas em cada departamento aprendendo sobre a edição e como fazer filmes e capturar a atmosfera certa. Foi nesse período que eu decidi que filmes de drama eram o que eu queria editar profissionalmente, mas também adorava trabalhar com música e artes e foi aí que eu comecei a editar meus primeiros programas que foram ao ar, como Arena e Omnibus alguns anos depois.

Eu acho que muitas pessoas se perguntam se os editores só começam a trabalhar quando as filmagens já estão prontas, ou você se envolve desde o início do projeto e no set?

O editor começa a trabalhar no filme normalmente uma ou duas semanas depois do início da fotografia principal. Então ele vai participar das filmagens até o fim da pós-produção que inclui a mixagem de som e a graduação (quando se decide os tons e a sensação do filme). Em outras palavras, bem no fim da produção.

Em documentários de TV é diferente, porque o editor começa assim que terminam as filmagens, mas nos dramas eu edito os dias que já foram filmados para o dia seguinte e se a cena foi toda filmada em um dia, então eu tenho que agregar a cena do jeito que eu acho que funciona no fim desse dia quando eu mostro ao diretor e recebo algum retorno. Óbvio que se for uma cena mais comprida ou complicada, vai demorar mais para que eu edite.

Em que ponto você recebe um filme como Harry Potter?

Recebo o filme nas melhores condições que puder, visto que eu não sou o diretor e posso às vezes interpretar mal uma cena que está na cabeça do diretor quando ele filma, mas geralmente os diretores com quem eu trabalho ficam muito felizes quando veem a primeira edição que eu faço de uma cena ou do filme inteiro, e eu espero ter capturado o melhor das atuações e mantido o andamento, o tom e o ritmo da cena ou do filme mantendo-o dentro das expectativas do diretor. Nesse estágio inicial eu incluo todas as cenas filmadas na edição, porque é praticamente impossível julgar quando devemos perder, encurtar ou alongar uma cena antes de você ter a chance de vê-la no contexto algumas vezes.

Tenho muita sorte de estar trabalhando com David Yates (diretor de Harry Potter) por quase dez anos agora e somos bons amigos e temos a mesma noção das coisas e quando você conhece bem uma pessoa e trabalhou com ela por tanto tempo, já é quase possível adivinhar como ela quer que o filme evolua. Quando terminam as filmagens, David e eu trabalhamos bem juntos e detalhadamente examinamos todas as cenas e vemos quando ela está funcionando no contexto do filme todo e se não estiver, experimentamos usar tomadas diferentes e dar ênfase na cena de uma maneira alternativa. Editar é um processo de constante evolução e mesmo quando uma única cena funciona, quando você a vê em contexto com o resto do filme e ela parece não funcionar, então é aí que você tem que analisar por que isso aconteceu e mudar para que fique de acordo.

Quanto você tem que descartar em um filme como Harry Potter?

Não posso dizer exatamente quanto do filme eu descarto, mas quando se pensa que são duas unidades filmadas de Harry Potter (os dois últimos filmes) quase que sem parar por um ano e cada filme tem cerca de 2h e 20min em media, não é preciso ser um gênio pra perceber que é muita coisa que fica de fora!

É difícil escolher quais partes do filme usar?

O papel do editor é saber diferenciar e escolher as melhores tomadas das múltiplas cenas de ação, que invariavelmente são filmadas com varias câmeras. O mais difícil (mas muito satisfatório) é passar por toda a filmagem mantendo o nível e a boa organização, eu tenho dois assistentes excelentes que me ajudam com essa tarefa. Editar é como ter um imenso quebra-cabeças sem a caixa com a figura que deve ser montada. OK, há o roteiro então você sabe que cena vem antes ou depois de qual, mas quando a edição começa, as escolhas são infinitas e é aí que eu tenho que mergulhar na cena e imaginar que sou parte dela de alguma forma estranha e orgânica e que dita onde e quando cortar outro personagem e por quanto tempo. Relendo isso soa muito esquisito, mas sinceramente é o que me ajuda a editar uma cena!

Quanto tempo leva mais ou menos para editar um filme com orçamento alto e essa duração?

Na maioria dos filmes o tempo de filmagem é quase o mesmo da edição, então uma filmagem de 12 semanas significa 12 semanas de edição (24 semanas no total), mas com Harry Potter filmamos por quase um ano, então vou levar mais ou menos esse tempo para editar – mas dessa vez são dois filmes e devido a quantidade de CGI (efeitos visuais) demora mais do que um filme convencional de drama.

Qual foi um dos seus projetos preferidos?

Além de Harry Potter que tem sido uma jornada incrível considerando que eu nunca havia trabalhado em um filme com CG tão complicada e pelo fato de eu estar envolvido com Harry Potter por mais de cinco anos (Mark editou Ordem da Fênix e Enigma do Príncipe e agora trabalha nos 2 últimos filmes da série), eu diria que da época em que eu trabalhava com dramas de TV, então sem dúvida “State of Play” se destaca bastante, principalmente por causa do roteiro brilhante de Paul Abbot (que foi como tudo começou), também dirigido maravilhosamente por David Yates com atores fantásticos, muitos dos quais estão agora em projetos maiores. Ganhei um BAFTA por esse trabalho, o que foi um encerramento maravilhoso para essa série de 6 partes da BBC de tanto sucesso.

Sua forma de editar teve que mudar quando você saiu de algo com tanto conteúdo adulto quanto “Sex Traffic” para algo mais amigável para as crianças como Harry Potter?

Sinceramente não. Editar é contar uma história – como manter o espectador envolvido intelectual e emocionalmente, seja adulto ou criança. As cenas têm uma estrutura narrativa suficientemente atrativa para manter o interesse do público? Eu acho que essa é a chave para fazer filmes ou programas de TV.

O que você prefere editar, programas de TV ou filmes?

Amo os dois, porque cada projeto traz desafios novos e interessantes. É óbvio que tudo depende da qualidade do roteiro e do diretor, pois o editor só é tão bom quanto o material que recebe. Tenho tido sorte, pois a maioria dos projetos nos quais trabalhei tiveram bons roteiros e diretores talentosos, com raras exceções!

Quão difícil é condensar a narrativa de um filme em um trailer sem tantos spoilers?

Na TV nós editávamos nossos próprios trailers e teasers, o que eu gostava muito, apesar de eles levarem um certo tempo para ficarem bons, mas nos filmes, particularmente Harry Potter, existe um departamento na Warner Bros que faz os trailers a partir dos cortes que mandamos para eles, isso é muito bem feito e sempre esperamos vê-los e ter um retorno sobre o que funcionou ou não.

Você possui uma filmografia bem variada. Se pudesse editar seu passado, mudaria algo?

Não, acho que não mudaria nada, pois tenho uma família incrível e que me apoia e tive muita sorte em trabalhar com alguns grandes diretores como David Yates, John Schlesinger, Paul Greengrass e Richard Eyre e eu aproveitei bastante meu tempo na indústria de filmes e espero continuar enquanto for humanamente possível e enquanto os diretores quiserem trabalhar comigo!

Você tem algum conselho para quem quer entrar nessa área de edição?

Todos os campos da indústria de filmes são difíceis de entrar hoje em dia, mas se você realmente quiser, você consegue, mas precisa de determinação e persistência.

Muitos jovens entram em contato comigo para ter acesso às salas de edição. Nunca os desencorajo, porque é uma area fantástica de se trabalhar, já que essas salas são essencialmente onde o filme é “feito”. Eu acho que a edição é uma forma de arte muito criativa que não é tão reconhecida quanto deveria (comparando com a cinematografia, design ou música), mas eu acho que é porque é uma arte tão invisível que o público deve entrar tanto na história a ponto de não perceber a edição, a não ser, é claro, que ela esteja ruim!

Como você acha que a edição será no futuro com CGI etc – É difícil trabalhar com a tela verde?

Quando eu comecei a trabalhar com Harry Potter era bem confuso, eu devo admitir, mas logo eu entendi porque certas cenas foram filmadas em tela verde e então usadas pelo departamento de efeitos especiais para criar certos cenários ou criaturas para contracenar com os atores de verdade. Enquanto usarmos atores de “carne e osso” eu estarei feliz.

Qual foi um dos seus momentos preferidos nos filmes de Harry Potter?

Um dos meus momentos favoritos é quando levamos o filme para Chicago antes que ele esteja com os efeitos finalizados e com uma trilha sonora crua para mostrar a um público que não faz ideia de que filme vai ver. Ser parte da reação empolgada das pessoas quando elas ficam sabendo que é Harry Potter é muito especial. Depois que acaba o filme, acontece uma sessão de perguntas e respostas e é muito interessante ouvir os comentários do público, positivos ou negativos. Isso nos ajuda a entender o que está funcionando com o filme e o que causa preocupação.

Então levamos esses problemas para a sala de edição na volta ao Reino Unido antes de “fechar” o filme e completar o áudio e os efeitos para o lançamento.

Qual foi um dos momentos mais desafiadores na sua experiência com a edição?

Além de Harry Potter, que tem sido um aprendizado imenso nos últimos anos devido à complexidade de combinar os efeitos visuais e o drama de um jeito que dê certo, editar “Sex Traffic” apresentou vários problemas, porque ele era filmado em 3 países diferentes por várias semanas, incluindo a Romênia no idioma local, mais o fato de ser um assunto traumático em um dialeto que eu não conhecia, o que apresentou vários desafios interessantes na edição de cenas de diálogo, mas eu fiquei muito orgulhoso do resultado, porque foi bem feito, é um drama difícil de digerir e que faz pensar bastante.

Você tem algum filme ou cena favorita do ponto de vista de edição?

Existem tantos filmes que eu admiro desse ponto de vista, mas três que vêm imediatamente à cabeça são Amnésia, Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças e Cidade de Deus. Trabalhos maravilhosos.

O que você gostaria de fazer depois de Harry Potter?

Depois de um pouco de descanso (já que eu estive trabalhando nos dois últimos filmes por dois anos e meio), adoraria trabalhar em um filme sem efeitos visuais ou telas verdes, só puro drama sem bruxos!

Muito, muito obrigado pelo seu tempo para nos dar respostas tão brilhantes. E uma nota aos leitores para ficarem de olho no novo “Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte I” que sai em novembro desse ano.

Por Bruno Longbottom

está na Potter Heaven há cinco anos, e hoje é editor do site. Corvinal, Jornalista, Cinéfilo apaixonado, não vê testralhos e não sabe voar de vassoura. No twitter, é o @bmaranhas.